sábado, 5 de março de 2011

O governo corta o orçamento mas não mexe nos juros


Ao anunciar cortes no orçamento de 50 bilhões de reais, o governo sinalizou para o chamado “mercado” (isto é, os grandes financistas que extraem ganhos monumentais da dívida pública) a opção por uma política econômica para atender a seus interesses. 


O ministro da Fazenda Guido Mantega tem se esforçado em dizer que não se trata de um ajuste fiscal à moda neoliberal, mas de um acerto orçamentário para amenizar os gastos feitos pelo governo em 2009 e 2010 no enfrentamento da crise financeira mundial, cujo êxito foi o pequeno reflexo da crise no Brasil.

A opinião do ministro tem, neste particular, uma importância apenas relativa. O fato concreto é a combinação das medidas tomadas pelo núcleo econômico do governo. O corte orçamentário faz parte do mesmo movimento de esfriamento da economia que inclui por um lado a recusa em negociar com as centrais sindicais um valor mais alto para o salário mínimo e, por outro lado, a continuidade da elevação da taxa básica de juros.

Pode não ser o receituário neoliberal completo, mas são medidas que fazem parte dele e que o país, para avançar, precisa discutir em profundidade e recusar o permanente privilégio dado pelo governo aos grandes investidores do mercado financeiro. 

Um cálculo feito pelo economista Márcio Pochmann mostrou que apenas 20 mil famílias de super-ricos são beneficiadas por 70% dos juros pagos pelo governo. No ano passado, o volume destes juros chegou a 200,5 bilhões de reais e isto significa que 140 bilhões foram parar nos cofres desta minoria que está montada no topo da riqueza brasileira e, sendo credora do governo, faz com que, na prática, trabalhadores e empresários do setor produtivo trabalhem para ela.

Mesmo assim, comentaristas econômicos reagiram com descrédito ao enorme corte orçamentário anunciado ontem (dia 28): dizem que o corte real chegará a 13,1 bilhões, e os demais 37 bilhões se referem a intenção de gastos, isto é, a despesas programadas mas que não serão concretizadas . Ou seja, querem mais. É o dogma neoliberal que a equipe econômica diz rejeitar mas que respeita e aplica: o ato de fé segundo o qual o governo precisa diminuir seus gastos para manter a economia em ordem.

A análise conservadora, partilhada pela área econômica, examina o orçamento de maneira parcial e incompleta, levando em conta apenas a receita e as despesas classificadas como primárias, e entram em pânico quando os gastos se aproximam dos ganhos. Não analisam o orçamento de forma completa, incluindo entre as despesas o montante pago em juros. Ao contrário, insistem no respeito ao superávit primário (o dinheiro que o governo economiza para pagar juros). Nesta linha, apontam o dedo para os gastos na área social, previdenciária, na manutenção da máquina pública, em investimentos para alavancar a economia. E escondem os valores consumidos pelos juros.

Daí a exigência de cortes cada vez maiores. Mas há uma pergunta que os trabalhadores e os setores produtivos precisam fazer: por que o governo não inclui, em suas metas de corte, parte dos juros pagos ao capital privado que vampiriza a dívida pública e, por tabela, a economia nacional? Precisam exigir que a equipe econômica responda a esta pergunta – e esta resposta é uma condição fundamental para aprofundar o rumo do crescimento econômico e da distribuição de renda. Os cortes anunciados afetam o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o programa Minha Casa Minha Vida e até o seguro-desemprego. Se forem considerados, como exemplo, apenas os ministérios das Cidades, Transportes, Educação, Esportes e Defesa, a economia forçada envolve 20 bilhões de reais – uma quantia que não precisaria ser cortada se o governo tivesse a coragem de fazer um corte moderado, de apenas 10%, nos juros pagos em 2010.


Editorial do Portal Vermelho.

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Ex-diretor da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e ex-presidente da União da Juventude Socialista (UJS) de Alagoas. Atual militante e presidente do Comitê Municipal de Maceió do Partido Comunista do Brasil, PCdoB.

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